segunda-feira, 30 de março de 2009

A espera




10/06/2002


Eu te esperei por te amar
E não me entreguei a um encanto qualquer
Quis fazer da solidão um santuário
Para proteger a mim e ao meu sentimento
No entanto, sem separar-me de ti nem por um momento
Em cada pensamento enderecei-lhe uma prece

Eu te esperei acreditando no tempo
Longe da tua estrada, mas confiando nos teus passos
Sei que não pude ver as pedras do teu caminho,
Nem te proteger de todos os tropeços,
Mas cada ferimento teu
Doeu demais em mim.

Eu te esperei sem perceber que a vida passava,
Que as datas se repetiam,
Que os fatos se acumulavam
E que mudanças aconteciam...

Eu te esperei tendo a certeza de que chegaria
Trazendo a felicidade e a paz de que necessito

Eu te esperei...
Com toda a esperança que o amor nos faz ter, eu te esperei
Mas não esperava que te encontraria
Para dizer-te neste dia
Apenas um “adeus”!


Por Aline D’Eça

domingo, 29 de março de 2009

Antes de Dormir


Eu não queria ficar esperando
Ver o sol nascer
Eu preferia que o sol não partisse
Sem você aqui
Para perguntar como foi meu dia
E me fazer dormir
Entre o calor de um beijo e outro
Entre a boca, o ouvido e o pescoço
Ter você para mim
Ah!
Eu já lhe disse tantas coisas
Só com um olhar
Acostumei-me com o seu perfume
Nos meus lençóis
E te amei através de um simples toque
Ou da sua voz
Tendo prazer sem nenhum esforço
Querendo sempre mais o seu corpo
Como se fosse rio
E eu sua foz.

Por Aline D’Eça
06/03/2003 

Destroços

18/02/1997

Ao trágico romance ainda ligada
Omito que não fui amada
Digo que o nosso caso
Foi fruto do acaso
A destroços se resumiu
E sumiu
Cruel destino
Dolosa verdade
Sua indiferença encontra-se impune
É que no amor não prevalece a justiça
Tudo se reduz a crime passional
Da minha prisão só restam seqüelas e mágoas
Meu desejo anda contido
Não quero tatos nem contatos
Estou em carnal purificação
É que sua insegurança me contaminou
Preciso de atenção
Seu egoísmo me fez solidão
Preciso de lucidez
Sua insensatez a desfez
Já não preciso que me aqueça
Me esqueça.



Por Aline D’Eça

Opostas estações

15/02/1997

Quando estou aqui
Não dá para rir
A solidão me faz mergulhar
Em mim
Tenho medo do meu medo
Perco-me no meu mistério
Respiro meu vazio
Sou Inverno
É difícil enfrentar o que há
Fora de mim
Tudo que tenho é o Nada...
Mas vou sair
Aonde ir? Não sei
Vou andar
Quero fugir dessas mesmas emoções
Vai ser duro o meu caminhar
Mas vou caminhar
Vou correr
Procurar a felicidade reservada para mim
Se sentires saudades minhas
Não faça teus olhos choverem
Nem mesmo teu corpo invernar
Procure o calor mais gostoso
E serei teu Verão.

Por Aline D’Eça

sábado, 28 de março de 2009

Pura sintonia

15/05/1997

Porque é tão difícil dizer eu te amo?
Para quê tanto orgulho?
Se já perdemos a noção de tudo

Se nos unimos num momento mágico
Nossos corpos já se entenderam tanto
Num inteiro, profundo abraço...

Acho
Que as palavras que nós não dissemos
E as atitudes que andamos tendo
São o maior motivo para essa aflição

Não!
Não quero ser um caso mal resolvido
Guardar um amor que não tem sentido
Voltar para ti sem haver perdão

Quero
Estar contigo em pura sintonia
Viver em breve tempo a alegria
E querer viver cada vez mais

Faz
Tanto tempo que eu não te vejo
E ainda sentimos tanto desejo
Porque agora é tão difícil nos amar?

Olha
Se ainda pensa em mim
Saiba que muito temos a resolver
É que eu ainda quero você.



Por Aline D'Eça

O que restou de nós

22/02/1997

O que me aconteceu?
É tão difícil sussurrar seu nome
Tudo de ti
Acho que esqueci
E o esquecimento mora longe demais
Algumas vezes você me amou
Mas jamais me aceitou
Não sei porque
Eu ficava, você partia
Eu esperava, você fugia
Eu chorava, você sorria
É tão difícil entender...
Não pude esquecer
Seu beijo prolongado de fervor
Seus olhos perdidos naquelas horas de amor...
É tão confuso...
Não sei em que acreditar
Quando estávamos distantes
Ficava a lembrança dos instantes
Que a paixão nos fez passar
Do luar sinto saudades
E do nosso lugar tão lindo de amar
Hoje aqui nesta cidade
Vejo tudo indo e vindo
Fora da claridade da lua
É tão triste...
Nunca mais houve alegria
Não é simples ser feliz nestes dias.


Por Aline D'Eça

terça-feira, 24 de março de 2009

Pacto II

31/03/2003


Ainda tenho
o teu cheiro
a tua voz
o gosto de um beijo
roubado
a tua boca
a tua pele
o teu corpo inteiro
guardado
dentro de um copo
os meus olhos
e meus lábios
molhados
submersos
no sabor
de sangue:
o que restou
de um pacto.

Por Aline D’Eça

Senti

09/1995

As palavras que não disse,
que não transmiti,
o sentimento interior
estão guardados em meu íntimo:
As palavras, acumuladas
O sentimento, ileso

A ilusão deixou-me diante da perda
antes que pudesse expressar meu sentimento
Estava decidida, aspirava muito
quando, de repente, encontrei-me com a realidade:
você saiu sem nem mesmo eu te dizer
o que sinto por você

Não virá nunca o que vi
diante de mim
no espelho...

Olhe para mim!
Perdi o controle das minhas ações
Já nem sei viver
Não sei sem você
E os sonhos tão intensos
que vi apagados?
E o sentimento?
Ninguém nunca o sentirá
da maneira tão intensa
quanto o senti!

Olhe para mim!
Perdi as rédeas de minhas emoções
te perdi antes mesmo de te ter
e de te revelar:
te amo.


Por Aline D’Eça


domingo, 22 de março de 2009

O espelho

16/03/2009

Não sei ainda qual a minha tarefa neste mundo. Escrever, talvez. Porque esta é uma das minhas maiores tendências. As palavras, para mim, sempre funcionaram como um espelho. Escrever era uma forma de me enxergar. Mas, a certa altura da minha vida, decidi fugir e tentar me autodescobrir de outra forma, adormecendo a poesia e despertando para um lado mais prático de me expressar. Embora nesta praticidade eu não tivesse além de mera espectadora, reportando fatos externos a mim.
É que à poesia eu me subjugava, como se mergulhasse numa caixa preta para lá descobrir meus sentimentos... Não tinha como escapar. Bastava um papel e uma caneta e pronto: iniciava-se a minha viagem para o mundo interior. Um mundo sensível, mas, ao mesmo tempo, avassalador... Cada palavra escrita era como uma peça de roupa a menos. Assim, ao final de cada verso, via-me nua por completo. Por isso o segredo, os papéis amarelados, o cofre, o esconderijo... Não estava preparada para exibir tal nudez. Pois no final era a mim mesma que não tinha coragem de mostrar-me nua. Mas hoje não. Não quero mais a covarde sensação diante do que para mim representa um espelho

Por Aline D’Eça

quinta-feira, 19 de março de 2009

Ímpar

29/03/1999

Vivo a morrer de amor
Sempre a me torturar
Este que falam ser “força maior”
Sempre me faz fraquejar

Faz-me pobre, o coração, no que sinto
Sou um mendigo a suplicar
Se me faltam a razão e o sentido
O que resta é me humilhar

Possuo um eterno amor servil
De quem sou escravo, sou leal
Por quem me infligiu
Tenho um amor irreal

Ando de joelhos
Curvo-me aos pés do domador
Deixo-me arder em desejos
- Tudo o que quiseres, meu amor!

Entrego tudo o que cobra
O resto comigo ficou
Contento-me com as sobras
Do que me faltou

Porque sou poeta
Tenho meia porta aberta à loucura
E o que me desconcerta
Já não tem chances de cura

De forma assim tão íntima
O que escrevo, olhos não poderão ver
O que me faz par e me faz ímpar
Só o coração pode entender

Eu sei que fere e dói
Mas prefiro ficar e persistir
Sei que este sentimento é feroz
Ele pode me matar e eu resistir!



Por Aline D’Eça

Ilusão ótica



É dia, estou acordada
pareço dormir
Sonhado de olhos abertos
você está aqui
Não posso fechar os olhos
pois vou descobrir
que a ilusão ótica
não me fará te sentir
De olhos fechados
restam-me quatro sentidos
e o não sentir:
seu cheiro
seu gosto
seu toque
sua voz
Ah, esse amor!
Faz-me cego com os olhos abertos
Com eles fechados é que posso ver!



Por Aline D’Eça
Em 15/02/1997

segunda-feira, 16 de março de 2009

Tocar, sentir, reagir...

A indiferença me apavora. Não sei conviver com o fato de não provocar sentimentos. O sentido para mim é tocar. As coisas, assim como as pessoas, existem para ser tocadas. E não se trata, aqui, de toque físico, pois pele é algo muito superficial e evasivo. Tocar é algo mais abrangente... É o ato de despertar algo em cada uma das pessoas, das coisas, dos seres que passam, para fazê-las sentir e para senti-las. Esse é o mecanismo. Até quando se caminha sozinho contra o vento, algo é despertado, no vento e em nós. E a excelência é talvez fazer com que esse algo despertado seja bom. Essa é a minha meta, embora na maioria das vezes pareça que todo o esforço não funciona. Ou se funciona, eu não vejo, desconheço... E daí nasce a minha necessidade de ouvir, de ver, de entender, que é constante e ilimitada. Para cada ação, uma reação; e desta equação o resultado é o entendimento. Sem isso, fica o pavor. Porque sentir o que as pessoas e as coisas sentem à sua provocação é algo inalcançável. E o inalcançável me fascina.

Por Aline D'Eça16/03/2009

domingo, 15 de março de 2009

Só para lembrar


















Se é para pensar que não sou seu,
Seria melhor esquecer
Que já fui estrela cadente
Só para te agradar

Realizei suas fantasias
Esqueci que tantas vezes me fiz esquecer
Promessas suas
Dívidas a flutuar
Mas se você quiser
Não me lembro do que mais venero
Mas não me lembrarei de esquecer
A Lua em seus olhos,
O Sol em seus braços e abraços

Por favor, meu amor,
Não me faça eternizar as dores
Guardar a escuridão em diamantes.


Por Aline D'Eça 
10/09/1996

Boneca de louça



21/04/2004

Seis e meia. Ele sempre chega quando o relógio marca este horário. Trinta minutos depois da Ave Maria. Acabo de rezar o terço, desligo o rádio, passo o café, ponho a mesa para o jantar e vou para a janela. Escondida pela cortina, observo ele bater bruscamente a porta do carro e entrar mal-humorado em casa. Nem toma banho, senta na poltrona, liga a televisão e põe os pés com as botinas sujas sobre a mesinha da sala. Sua esposa surge apressada após ouvir os gritos. Nunca está arrumada. Não precisa, quase nunca sai de casa, nem recebe visitas. Ela sempre usa bobes nos cabelos e vestidos velhos. Traz, com grande afã, um copo e uma cerveja. Por que sempre traz o copo? Ele nunca toma de outro jeito: põe a boca no gargalo e bebe.

Passada uma hora, ele levanta e se dirige à sala de jantar. Parece esfomeado. Não sei ao certo o que acontece, não consigo ver pela janela, mas depois de alguns instantes a mulher começa a chorar. Ele bate nela e manda-a chorar baixinho, caso contrário baterá mais. Um selvagem! Homem forte, barba por fazer, está sempre suado, cheirando a óleo e a cerveja. Um covarde! E sua mulher tão frágil e burra. Sim, burra... Como pode continuar casada com um animal daquele?


Aquela pobre mulher apanha muito. Todos os vizinhos sabem, mas ninguém toma uma atitude! Isso me indigna. Eu, porém, nada faço... Pego o telefone às vezes, mas não consigo chamar a polícia... Pobre coitada, a encontrarei na missa de domingo. Calada, valendo-se de um véu sobre o rosto para esconder as marcas roxas, terá pressa. Como de costume, pegará suas três crianças e voltará para casa, sem poder conversar.


Meu marido chegou. Já são oito horas. O Osvaldo sempre me traz flores e dá um beijo em minha testa. Minha pequena, como foi seu dia? Sempre gentil e delicado comigo. Tenho sorte em tê-lo como companheiro. Meu marido me ama, seria incapaz de erguer a voz para mim, quanto mais me bater. Jantamos e depois de ajudar-me com a louça, ele me chama para dormir. O Osvaldo trabalha muito, está sempre estafado, dorme rapidamente. Sou feliz com ele. Fazemos amor uma vez por semana, aos sábados. Aos domingos, depois da missa, almoçamos na casa de sua mãe.


Toca a Ave Maria e em meia hora o vizinho chega. Tudo se repete. Já tenho cronometrado na minha cabeça. A mulher apanhando... Ele parece ter as mãos pesadas. Bate sem piedade no rosto da pobrezinha. Troglodita! Uma mulher tão frágil, tão franzina... Ela tem marcas roxas no rosto e pelo corpo. Osvaldo nunca me bateria... Espio pela janela. Depois de algum tempo o silêncio impera na casa ao lado. Meu marido chega. É sempre carinhoso e gentil. Trata a mim como uma princesa, sua bonequinha de louça... Nunca me bateria.


Manhã de quarta-feira e volto do mercado. Surpreendo-me ao ver aquele cafajeste cuidando do jardim. Como pode ser tão delicado com as flores e tão estúpido com a mulher? Calafrios. Tive medo do seu olhar. Agachado no jardim, ele percorreu meu corpo de baixo a cima com os olhos... Senti-me despir... Bom dia madame. Gentileza não combina com ele. Porém, ajudou-me com as compras. Pude reparar nas suas mãos, tão grandes e grosseiras. Que estrago poderia fazer no rosto de uma mulher... Calafrios. Tive medo, mas não pude rejeitar a ajuda. Deixou as sacolas na varanda, sorriu e voltou para o seu trabalho. A delicadeza realmente não lhe combinava. Um homem como aquele, rude, voraz... Com aquelas mãos... Ai... Se ele me batesse forte na cara, estaria perdida. Bem que eu iria gostar. E gozar.



Por Aline D'Eça


* Uma homenagem ao polêmico e fantástico Nelson Rodrigues

sexta-feira, 13 de março de 2009

Canto Solo

20/03/2003

A Paz.
Luzes em Bagdá
brilharam no céu
ao alvorecer.
Vozes do mundo inteiro
cruzaram terras e oceanos
para calarem-se no dia vinte.
Passos sincronizados,
ao canto solo de um pássaro
que prefere o ninho,
dançam em terras mesopotâmias
Acorda o Tigre e o Eufrates
a voz de um “deus”:

“Abro as portas de tua casa
Observo-te trancado no meu quarto
Acredite:
Eu sei o que é melhor para ti!
Minimiza agora esta tua (in)segurança...”
...

O mal faz bem
para quem não tem
a Paz.



Por Aline D’Eça

*Zero horas do dia 20 de março de 2003
Os EUA atacam Bagdá
E este foi o meu pequeno protesto contra a covardia de G.W. Bush

A Rosa




06/11/1999

Sou uma Rosa solitária
A única do galho e do jardim
Moro em um jardim distante
Onde não há ninguém
Que possa cuidar de mim.

Sou uma Rosa indefesa e rara
Um dia, quando ainda era botão,
Percebi crescer em mim
Ao invés de espinhos, um coração.

Certa vez um lindo anjo visitou-me
Como num encanto, em um final de tarde
Admirou-me, beijou-me e partiu
Sem perceber que me ensinara
O que é a Saudade.

Outras tardes vieram,
Mas não voltei a vê-lo
Lágrimas, noite e dia chorei
Com medo de perdê-lo.

Veio a noite e a Lua falou
Que em todo mundo, nunca vira
Uma rosa que se apaixonou.

O Sol um dia disse-me
Que ele mora pertinho do mar
Quis poder rasgar o chão,
Só para poder o encontrar

Mas, como sou apenas uma Rosa,
Pedi a um colibri
Para ir sempre até o meu anjo
E roubar os seus beijos para mim.




Por Aline D'Eça

quinta-feira, 12 de março de 2009

Anjo meu



 Onde pousas, Anjo Meu
E descansa tuas asas?
É na Terra ou no céu
Onde tens tua morada?
Se és sonho, eu não sei
Mas comparo tua chegada
À Lua no meio-dia,
Ao Sol na madrugada.
Qual estrela tem teu nome,
Meu Anjo querido?
Na esperança de te encontrar,
O brilho dos teus olhos eu procuro
Em cada olhar.
Enfeitas de flores o meu horizonte
Do amor és tudo o que quero
Se és sonho, é o mais lindo que existe
Anjo Meu,
Olho o mar e te espero...



Por Aline D’Eça
01/11/2000

quarta-feira, 11 de março de 2009

Nenhuma prática

24/02/2000

O meu pai quer que eu sirva
à Aeronáutica
Minha mãe quer que eu faça
Artes Plásticas
O meu tio me matriculou numa escola
de Informática
Minha tia me arranjou um professor
de Matemática
Meu irmão diz que eu sou
uma Problemática
E eu só quero ser poeta mas detesto
a Gramática!


Por Aline D'Eça

Não te quero


Não direi que te amo
Nem sei se é amor o que sinto
Mas se eu descobrir que te amo
O amor que carrego eu minto!

Não direi que te quero
Não! Não posso querer-te!
Nem esperar de ti o que espero
Nem sonhar que possa render-te!

Não desejo te encontrar
Eu preciso me esconder
Tenho medo do teu olhar
Os meus olhos não podem te ver!

Não quero que ligues para mim
Não te darei o meu telefone
A tua voz, eu não quero ouvir
Eu até esqueci o teu nome!

Não necessito do teu amor
Nunca mais vou me iludir
Não que eu tenha medo da dor
Mas contigo aprendi a mentir!



Por Aline D'Eça
18/09/2001

Folhas Caídas

06/03/2003

Sem ação
Sem palavras
Os papéis em branco espalhados pela mesa
Fonte seca
Céu sem estrelas
Vida que parou na beira da estrada
Parou porque a rosa murchou
Um amor acabou
Acabaram-se as lágrimas
Folhas caídas
Noites infinitas
Nesta longa espera
O mundo dá voltas,
Mas desta vez não voltou
Ainda a Primavera.

Por Aline D'Eça

Normal

18/04/2004

Apenas um passo. Um passo à frente e estaria feito. O pé não encontraria o chão e a gravidade se encarregaria de puxar o resto. Onze andares. Três metros e meio cada um. Aceleração da gravidade nove vírgula oito metros por segundo ao quadrado. Em quanto tempo chegaria ao chão? A equação de Torricelli resolveria, se a lembrasse. Quem mandou matar as aulas de física?! Deixa pra lá, a calculadora está muito longe mesmo. É só fechar os olhos e ir. Simples como tapar a respiração e cair na piscina. Já fiz isso tantas vezes, porque não consigo agora? Acho que nunca pulei na piscina de roupa, talvez seja isso. Não, não vou tirar a roupa. Imagino a foto no jornal, minhas celulites em manchete nacional. Nem pensar!... Descobri! É só não pensar. Vou tentar... ...................................... “Ai que frio”...................................... Não dá certo. O que será que vai sair no jornal? Eu queria estar aqui amanhã só pra ver os repórteres enchendo todo mundo de perguntas. Por que ela fez isso? Ninguém ia saber. Quem choraria? O que iam dizer? Ela era uma pessoa normal, assistia as aulas todos os dias, comia hambúrguer com batata frita, gostava de novela, tinha um ex-namorado. Uma pessoa normal... Era tudo que não gostaria de ser, por isso estou aqui, para ser diferente. Mas, pensando bem, pular de um prédio de onze andares é diferente? Acho que não vou ser a primeira nem a última pessoa a fazer isso. Que anta! Nada original. Um suicídio normal. Talvez nem desse manchete. Tenho que pensar em algo melhor... É... vou deixar para amanhã... Nossa! Como a lua está linda! Nem tinha reparado que ela estava nascendo. A visão daqui é tão melhor... Ops! O que é isto? Ai!!!!!! Um morcego no meu vestido! Sai morcego! Saaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaiiiiii..............
- Você a conhecia? Sabe o motivo que a levou a cometer suicídio?
- Não sei. Ela era uma pessoa normal...


Por Aline D'Eça

terça-feira, 10 de março de 2009

Imortal


Que pode uma jovem mortal
Diante do amor?
Reconhece na criatura amada
Um deus que adora e contempla
Tal como fez Psique
Ao ver pela primeira vez a face de seu marido
O mais belo e encantador dos deuses
A personificação do amor: Cupido

Que pode uma jovem mortal
Fazer com o que resta de si
Quando o seu deus, sua paixão,
Abre as brancas asas e voa sem destino
Deixando-a estendida no chão?

Que pode uma jovem mortal
Senão aquiescer aos caprichos da Vênus
Enfrentar infortúnios e sofrimentos
Para ter devolta o que outrora perdera
Causando-lhe imensos tormentos?

Que pode uma jovem mortal
Querer depois de ser acordada
De um longo sono cruel
Pelo mais doce beijo
Dos amados lábios de mel?

Que mais pode uma jovem mortal
Em suas núpcias desejar
Dos deuses em assembléia celestial
A não ser de que pelo amor
Também seja tornada imortal?



Por Aline D'Eça
Em 25/04/2003

Um bom coração

21/02/1997

É triste olhar para o futuro
e não perceber o que está guardado para nós
Mas como saber?
É tudo tão estranho
As boas coisas a vida nos tira
Servindo nossos erros em bandejas
fica difícil lembrar nossas vitórias
realidade ou história?


Os contos já não encantam
Branca de Neve no caixão apodrece
É que o Príncipe se entorpece
E os Anões ocupam-se com a corrupção
Os bons valores são esquecidos
nas doses de conhaque, nas drogas, no sexo e na televisão


Fé é riqueza para poucos
o deus de hoje é o Dinheiro
É muita gente com muito pouco
e gente com muito mais do que precisa

Os pobres, por baixo,
colocam os ricos lá em cima
Os ricos, de cima, pisam em quem está por baixo
Eles não querem saber de ajudar!


Só vejo promessas...
Q
uero fugir depressa
e me esconder em um bom coração
Meu pai, minha mãe,
minha irmã, meu irmão
Um bom coração
Meu Deus, meu Amor
Aquele amigão
Ou até mesmo
no meu coração.

Por Aline D'Eça

Ficar

18/03/1995

Se eu pudesse ficar...
À noite largaria o mundo,
aprenderia de tudo,
a ter você a me preencher
Logo mais prenderia-me aos seus braços
e neste instante enxergaria
que já não vivo sem seus olhos

Ficar e ficar, noite e dia, bastaria

Se você ouve, eu não posso chamar
Se você correr, poderá cair
Mas se você gritar, só ouvirei você

Se eu pudesse ficar...
A noite buscaria
a chama que acenderia
para nunca mais apagar
E quando aos teus lábios me entregasse,
só saberia ficar
com o espírito que encontrei

Se eu pudesse ficar...
Na manhã, tudo quieto
e ninguém mais por perto
só batidas e suspiros
só dois corpos descansando aquecidos
Vítimas e os vestígios do seu crime:

O cheiro de amor pairando no ar
e a cicatriz que não saiu
e nem sairá.

Por Aline D'Eça


*Tinha apenas 14 anos, mas já com "apenas duas mãos e o sentimento mundo..."

domingo, 8 de março de 2009

Caixa Preta

14/04/2004

Um PACTO. Ele foi desenhado assim em meu corpo, com letras maiúsculas. Ainda sinto minha pele sendo rasgada milimetricamente por uma lâmina abrasante. Ainda vejo a fumaça subir. Com fogo. Cheiro de carne queimando.

Um corpo novo riscado sobre meu corpo. Eu o desejei. Eu o tive. Meu corpo reinventado exatamente como eu cobiçava. Etapa a etapa. Aqueles olhos castanhos se sobrepuseram aos negros dos meus. Ah, aqueles olhos tinham mel. Quis prová-los com a língua. Eram exatamente doces. Desde então meu olhar nunca mais foi meu. E aqueles lábios? Sim, eles também reinventaram os meus. Eram maduros tais quais frutas vermelhas. Deles destilavam um néctar celestial, do qual à medida que eu me servia sentia-me narcotizar. Lentamente fui percebendo um desenho de outra boca substituindo a minha. Com fogo. Cheiro de carne queimando.

Diante do espelho via outro rosto. Aquele rosto não era meu, mas já era eu. Cada dia uma nova parte de meu corpo era remodelada. Metamorfose. Um outro ser mergulhava em mim. Cabeça, pescoço, peito, barriga, sexo... Sim, até o sexo foi reinventado. Com ele eu ganhei e me perdi. Já nem sei ao certo se fui eu que me penetrei ou se penetraram em mim. Com fogo. Cheiro de carne queimando.

Um outro ser, um outro corpo sendo definitivamente desenhado em mim. Tatuagem. Meu corpo e novos traços. Adquiri novas pernas e pés, mas perdi o comando sobre eles. Aonde me levavam? Ao céu? Ao inferno? “Sem escolhas, lembra?”. Nada era meu. Tudo era eu. Novos sentidos e não sentidos. O que ganhei? O que perdi? Um corpo novo tatuado sobre o meu. Com fogo. Cheiro de carne queimando. Este corpo, no entanto, era oco. E comecei a sentir o vazio mergulhar em mim. Sentia? Não! Eu não sentia! “Sem sentidos, lembra?”. Os pés e as pernas já não sustentavam o novo corpo. Do sexo foi extinta toda sensibilidade. Um vento frio soprou na barriga. No peito, uma caixa preta. Minha alma era arrancada com força. Ela não cabia neste novo corpo. Senti-me afogar em mim. Debater-me sobre mim. Desesperadamente. Respirar... Respir...ar... Res...pi...rar... Res... Um último e longo suspiro. Pacto cumprido.

“Pertencer ao outro eternamente. Com fogo. Cheiro de carne queimando”.


Por Aline D’Eça
Em 14/04/2004

INSTRUÇÕES DE LEITURA

Devassando o que era inviolável


Ela era inviolável, mas foi aberta. Por quê? Não sei. Mas era preciso.

Até mesmo Pandora sucumbiu e abriu a misteriosa caixa...
Em meio a tantos males, ainda restou a Esperança, única forma do homem não sucumbir às dores desta vida.
Tudo aqui era secreto, mas decidi devassar a misteriosa caixa e abrir os meus segredos.
Poesias, contos, frases, desabafos... não preciso mais guardar tudo isso. É preciso livrar-se do que é velho e abrir espaço para coisas novas.
Aqui estou, disposta a fazer isso.
Peço apenas que observem as datas de cada um destes textos. Eles diziam respeito a fases, muitas das quais já passaram...
Ah... e quanto às cópias, aviso aos navegantes que tudo aqui está devidamente registrado.

Boa leitura.